Transposição do São Francisco prova que
geógrafos não têm ideias próprias
terça-feira, 22 de janeiro de 2013
Já no ensino médio, quando tomei contato com a geografia crítica, os
professores dessa disciplina repetiam o mantra de que o problema do
Nordeste não é a seca, mas a estrutura fundiária e a pouca
industrialização. O mesmo discurso era repetido pelos geógrafos na
universidade, que se baseavam em duas fontes principais para chegarem a
tal conclusão. A primeira delas eram as críticas da geografia marxista
ao determinismo ambiental, que seria nada mais do que uma ideologia
usada pelas classes dominantes para mascarar a verdadeira origem dos
problemas sociais e ambientais. A segunda fonte eram os diagnósticos
elaborados por Celso Furtado, já na década de 1950, para dar base às
políticas de desenvolvimento do Nordeste. Foi a partir da fundação da
Sudene, pois, que os economistas preocupados com o "problema do
Nordeste" colocaram em segundo plano a necessidade de obras contra a
seca, pois asseguravam que o desenvolvimento regional só seria alcançado
mediante políticas de incentivos ficais, concessão de crédito para
investimentos produtivos e políticas de distribuição de terras, entre
outras.
Bem, as críticas marxistas ao determinismo ambiental sempre careceram de
coerência, pois, conforme já demonstrei em outro texto, os teóricos
anticapitalistas também usam teses deterministas quando lhes convém
(ver aqui).
Mas o pior mesmo é quando os teóricos críticos simplesmente esquecem
tudo o que disseram ao longo de décadas para poderem fingir que são
coerentes quando apoiam os governos do PT.
Realmente, os geógrafos e economistas regionais gostam de pensar que a
esquerda só chegou ao poder com Lula, o que é absolutamente falso, já
que os governos de FHC foram claramente de esquerda. Mas, ainda que
fosse verdadeiro que o PSDB é um partido de direita, a lógica mais
elementar obrigaria esses especialistas a admitir que os governos do PT,
se avaliados honestamente sob o crivo do que eles escreveram até o
início dos anos 2000, não poderiam deixar de ser qualificados como "de
direita"!
A melhor demonstração disso é a mal-fadada transposição das águas do São
Francisco. A política fundiária de Lula e Dilma é uma continuação do
que já vinha sendo feito por FHC, e as obras de transposição foram
vendidas pela propaganda e os discursos populistas de Lula como se
fossem a solução final para os problemas sociais do sertão nordestino!
Onde estão os geógrafos críticos para bradar que Lula está fazendo o
velho jogo das classes dominantes com o fim de desviar a atenção da
verdadeira origem do problema, que seria socioeconômica? Aziz Ab'Saber,
um homem coerente com suas ideias, fez críticas de conteúdo técnico
contra a transposição. Mas por que os geocríticos se eximem de concluir o
que a lógica exige, isto é, que os discursos e ações dos governos do PT
no Nordeste retrocederam meio século? Que a propaganda oficial regrediu
aos tempos de Getulio Vargas, quando o Estado apontava a realização de
obras contra a seca como solução para os problemas regionais?
Mais grave ainda, porém, é que os descalabros que vêm acontecendo na
execução das obras de transposição revelam que comparar Lula com Vargas
pode ser até injusto com este último. A transposição, em lugar de um
programa paliativo magnificado por um discurso de base determinista, se
enquadra melhor como exemplo da chamada "indústria da seca". Depois de
faturar votos com a propaganda feita na inauguração das obras, Lula as
abandonou, e tanto que já existe até mato crescendo no meio dos canais
de concreto que já tinham sido construídos, conforme a foto acima! O
custo das obras cresceu barbaramente desde que foram iniciadas, novas
licitações estão sendo feitas, e o TCU vem apontando graves suspeitas de
superfaturamento (o que já é de praxe nas gestões petistas, aliás). E
as pessoas das áreas próximas aos canteiros de obras, usadas pela
propaganda lulista para comprovar que a transposição significava o fim
da pobreza no sertão, perderam o pouco que haviam ganhado inicialmente!
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