Veiculado pelo Correio da Cidadania a partir de 23/10/13
Paulo Metri – conselheiro do Clube de Engenharia - 23/10/2013
Um amigo me perguntou, assim que soube do resultado do leilão de
Libra, se ele tinha sido um sucesso ou um fracasso. O interessante é
que, em muitos momentos na vida, respostas curtas não satisfazem.
Comecei a explicar a ele que, se compararmos com a alternativa de
entregar Libra através da lei das concessões (no 9.478), o que ocorreu
foi um sucesso. Se compararmos com a alternativa de entregar o campo à
Petrobras, sem leilão prévio, para ela sozinha assinar um contrato de
partilha com a União em melhores bases para a sociedade, o ocorrido
foi um fracasso.
Neste momento, vem a célebre argumentação da falta de recursos da
Petrobras. É verdade que o superbônus definido pelo governo atingiu
seu duplo papel de conseguir arrecadar recursos para o superávit
primário e de desalojar esta empresa da pretensão de ficar sozinha com
o campo. A curtíssimo prazo, segundo autoridades, a empresa tem falta
de recursos, sim. Mas, se ela passasse a ter, no seu portfólio, um
campo com mais de 10 bilhões de barris, considerando que sempre foi
competente para produzir petróleo, não teria a mínima dificuldade para
obter financiamentos. Com o superbônus, o governo trocou o benefício
de satisfazer o superávit primário, de curtíssimo prazo, por perdas
que irão durar 35 anos.
Considerando os impactos para a sociedade brasileira, a alternativa
com a Petrobras, que está dentro da lei, pois atende ao artigo 12 da
lei no 12.351, é a melhor, à medida que ficamos com 100% do petróleo,
assim como 100% do lucro. Não sei se consegui, mas tentei explicar ao
amigo que o leilão ocorrido consistiu em um “meio fracasso” e um “meio
sucesso”. Meus amigos de esquerda dirão que foi um fracasso total.
Quero lembrar a eles que a manchete principal de um dos jornalões, no
dia do leilão, era que a lei dos contratos de partilha precisava ser
reformulada, pois criava grandes dificuldades. Obviamente, queriam o
retorno das concessões para o pré-sal.
Infelizmente, existe no nosso país uma dicotomia também na mídia. Acho
que a sigla PIG foi criada pelo jornalista Paulo Henrique Amorim,
representando o Partido da Imprensa Golpista, que congrega a imprensa
do capital. Aquela que busca iludir nossa sociedade para colher o
máximo de aceitação dela, contrariando até os seus próprios
interesses. Concordo integralmente com o criador da sigla PIG.
Entretanto, existe também, para mim, o PIP, o Partido da Imprensa
Petista, que é sempre favorável a qualquer decisão do governo Dilma. O
PIP está mais em sites e, na maioria das vezes, concordo com as
posições que ele toma. Mas, na questão de Libra, o PIP e a presidente
se comportaram pessimamente. Não ouviram, não dialogaram, quiseram
“criar verdades”, igual aos manipuladores do PIG.
Não concluam que, por não apoiar a posição neoliberal tucana, nem
concordar com a posição privatista petista, eu seria adepto da dupla
Marina e Campos, até porque, possivelmente, eles devem concordar com a
posição tucana. Aliás, é sofrido ser de esquerda em um país como o
nosso, onde há total controle das massas através da disseminação
abusiva de posições de interesse do capital ou do governo, pelos meios
de comunicação, sobre quase todos os temas. Esta mídia irreal,
incompleta e falsa não analisa os fatos, omite opiniões, desvirtua
acontecimentos e conclui, na maioria das vezes, errado, não ajudando
em nada a sociedade. Não há um debate público na mídia sobre pontos
relevantes.
O tema do destino dos royalties tomou todo o tempo do noticiário e
debates porque era indiferente para o capital e, além disso, ajudava a
esconder temas cuja conscientização era inconveniente, como os modelos
para exploração de riquezas minerais no Brasil. Nada foi debatido
sobre o monopólio, quando ele foi extinto, em 1995. Ouvia-se, à
exaustão, que no monopólio, por não haver competição, o monopolista
irá ofertar o produto com baixa qualidade e por preço alto. Isto é a
mais pura verdade, se for um monopólio privado.
Entretanto, a mídia silenciava por completo sobre o monopólio estatal
poder ser a melhor opção para a sociedade, desde que controlado para
evitar o corporativismo.
Retornando a Libra, os royalties a serem destinados para a educação e
a saúde, tão proclamados por um dos porta-vozes do governo, que
invadiram nossas televisões nestes dias, seriam idênticos, se 100%
deste campo tivesse sido entregue à Petrobras, como já descrito.
Então, não era um argumento que diferenciasse alternativas.
O PIG e o PIP não falaram sobre a existência da alternativa de o campo
de Libra, friso bem “campo”, posto não ser um reles bloco
exploratório, dever ser entregue à Petrobras para 100% dos
rendimentos, assim como 100% do petróleo produzido pertencerem ao
governo brasileiro. O PIG e o PIP boicotaram esta alternativa. 99,9%
dos brasileiros não souberam da sua existência. O PIG por querer
satisfazer ao máximo os interesses das empresas estrangeiras, que só
aceitam as concessões, e o PIP por querer satisfazer a presidente
Dilma, que está preocupada com o superávit primário. A Petrobras
poderia prometer entregar 80% ou mais do excedente em óleo para o
Fundo Social, enquanto o consórcio ganhador se comprometeu só com
41,65%. Aliás, 41,65%, que poderão não ocorrer. Poderá ser remetido
bem menos que este valor. Mas isto terá que ficar para outro artigo.
A presidente Dilma fala que o leilão não correspondeu a uma
privatização. A Shell e a Total não são empresas privadas
estrangeiras? A CNPC e a CNOOC não são empresas estrangeiras? Elas não
passarão a ter a posse de uma parcela do petróleo e do lucro gerados?
Não poderão fazer com suas parcelas de petróleo o que bem quiserem?
Não poderão remeter suas parcelas de lucro para o exterior? Então,
desculpe-me presidente, mas isto é privatização e a negação do fato é
tergiversação.
A presidente falou também que ficará no Brasil 85% dos rendimentos de
Libra. Trata-se de uma afirmação corajosa, por vários motivos. Por
exemplo, para obtenção destes 85%, utiliza-se, dentre outros fatores,
a arrecadação de 25% do lucro para o imposto de renda. Este imposto é
cobrado da empresa, e não do campo petrolífero. Existem várias formas
de se reduzir o imposto a ser pago pela empresa, bastando ver, por
exemplo, o quanto a Petrobras declara de lucro e o quanto ela paga
deste imposto. Além do exemplo do imposto de renda, poderiam ser
feitos outros questionamentos a este número de 85%, mas um artigo só
não suporta tantas considerações.
A presidente não falou nada sobre a perda da possibilidade de ação
geopolítica porque o Brasil está entregando em torno de 46% do
petróleo produzido em Libra para as empresas estrangeiras. A sociedade
não sabe nada disso. Pelo seu valor político e econômico, Libra
mereceria um plebiscito com debates prévios diários nas televisões,
durante uns 30 dias, para conscientizar a população.
Nestes dias, o povo só recebeu os assédios de informações truncadas do
PIG e do PIP. Em compensação, ficaremos durante 35 anos com a Shell, a
Total e as chinesas também plantadas em Libra.
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