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quarta-feira, 28 de maio de 2014

O problema da concentração econômica

O problema da concentração econômica



O livro de Thomas Piketty serve de alerta para a proeminência do capital financeiro no mundo

por Paulo Yokota — publicado 26/05/2014

A publicação da versão em inglês do livro Capital in the Twenty First Century, do economista francês Thomas Piketty, provocou um novo surto da discussão do problema da concentração econômica. O assunto que vem sendo discutido desde Karl Marx, indicando ser da natureza do sistema capitalista provocar este fenômeno, mostra que mesmo com a aspiração igualitária existente no mundo, expressa na atual política da maioria dos países, como aponta o professor Antonio Delfim Netto, não se conseguiu estabelecer um sistema eficiente desta correção, tanto pela tributação como pelas agências que procuram preservar a concorrência.
Nas principais economias do mundo, inclusive a chinesa e a russa, por motivos que vão além da natureza do funcionamento do sistema de mercado, como as privatizações de antigas estatais e suportes governamentais que beneficiaram grupos ligados ao poder, os dados disponíveis mostram que está havendo uma concentração da renda, mesmo com a existência de uma tributação que pretende ser progressiva para corrigir parte do problema. Na realidade, além da renda o que vem ocorrendo é a transferência de patrimônios que privilegiam poucos.
Alem do que ocorre ao nível dos contribuintes individuais, e das atividades que por razões tecnologias determinam tendências monopolísticas, as dimensões crescentes dos grupos econômicos se inclinam à formação de oligopólios aproveitando as vantagens das escalas. Nem mesmo a existência de algumas agências que têm como finalidade a preservação dos mecanismos de concorrência corrige esta propensão. Constata-se que nos processos de desenvolvimento acelerado das economias, aproveitando os ganhos das dimensões, mesmo com intenções oficiais de melhoria da distribuição da renda, ocorrem acentuadas concentrações que nem sempre são neutralizadas.
O setor financeiro aparenta ser o que mais determina o aproveitamento de sua dimensão, provocando inclusive o controle de outros segmentos da economia. Chega a dificultar medidas corretivas ou punitivas de parte das autoridades, mesmo quando constatados comportamentos condenáveis, como os que estão sendo divulgados recentemente. Alegam riscos sistêmicos que possam até abalar algumas economias nacionais, consagrando-se o princípio de que são demasiadamente grandes para falirem.
Tradicionalmente, o setor de petróleo é clássico onde algumas poucas empresas possuem participação preponderante, com o abuso do poder político que conseguem, mesmo que tenham sido combatidas. O desmembramento da antiga Standard Oil resultou nos Estados Unidos, na primeira metade do século XX, em alguns artifícios para a continuidade de grandes grupos econômicos, como a criação de holdings.
Também as commodities agrícolas sempre contaram com as chamadas “majors”, que aproveitaram as vantagens das suas escalas mundiais para operarem, num número limitado, no comércio internacional. As dimensões mínimas existentes em algumas atividades sempre favoreceram que poucas empresas tivessem um papel preponderante em alguns setores como ocorre na mineração, siderurgia, produção de alumínio, papel, cimento, farmacêutica, construção pesada e muitos outros. Não é um fenômeno que se restringe a alguns países, inclusive, independe do regime político adotado.
Atualmente, a dimensão e o poder do segmento financeiro acabam inibindo ações de controle de organismos internacionais como o FMI – Fundo Monetário Internacional, BIS – Banco Internacional de Compensações (o banco central dos bancos centrais), o BCE – Banco Central Europeu entre outros. Todos sabem que alguns bancos deflagraram a crise mundial a partir de 2007/2008 e, no entanto, receberam assistência astronômica de alguns países para evitarem um mal maior. Os seus lucros foram exorbitantes, premiando dirigentes que deveriam ser punidos por gestões perigosas.
Os fluxos financeiros que superam em milhares de vezes as movimentações comerciais continuam sem possibilidade de regulamentação, ainda que os especialistas entendam que eles devam ter algumas restrições importantes. São desequilíbrios que podem conduzir a situações perigosas, diante das exageradas concentrações econômicas, onde o poder político ainda não encontrou mecanismos eficientes para suas correções. Mas, é necessário que continuem tentando, pois devemos crer que um mínimo de racionalidade acabará prevalecendo.

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