Os 10 motivos que levam Alckmin a reprimir os estudantes (e pelos quais eles devem permanecer lutando)
Os 10 motivos que levam Alckmin a reprimir os estudantes (e pelos quais eles devem permanecer lutando)
Luísa D'Ávola - 16/10/2013
No dia 15 de outubro, dia dos professores e professoras, estudantes da
USP se convidaram a um encontro com o governador Geraldo Alckmin.
Muito provavelmente o tucano não os receberia. O diálogo não lhe convém muito.
Era
uma manifestação que se mostrava vitoriosa, mas no meio do caminho
tinha uma tropa. Foi na Marginal Pinheiros que a polícia decidiu acabar
com o ato, muito longe do Palácio, mas muito afinada com as ideias
palacianas de Alckmin e Rodas. Foram dezenas de bombas, presos e
feridos. De maneira geral, as pessoas foram presas e reprimidas de
maneira aleatória, sem nenhuma vestígio de terem feito algo a mais do
que se manifestar pelas ruas da cidade.
Mas, afinal, qual o
motivo para a truculência desenfreada? Durante as jornadas de junho os
governantes não aprenderam que os choques repressivos apenas inflam as
manifestações? Ainda mais se elas, como é o caso dos grevistas uspianos,
representam lutas justas, concretas e de aceitação popular, como
Diretas Já, paridade nos conselhos, e um processo de estatuinte
democrática.
Abaixo, alguns argumentos que podem indicar uma hipótese:
1.
O movimento da USP vem construindo-se de maneira extremamente sólida.
Desta vez, foi um longo processo de construção de uma campanha por
democracia na universidade. Essa campanha foi capaz de envolver os mais
amplos setores da universidade pois, ao invés de fazer uma luta somente
demarcatória, obstinou-se a buscar vitórias. Entre várias iniciativas,
um amplo plebiscito construído pelos três setores que reafirmou, agora
em número, a vontade da comunidade em exercer o direito de decidir os
rumos desta universidade pública.
2. Para engrossar o
caldo do que significa democratizar a universidade – e claro,
engrossando também o ódio da burocracia acadêmica e governamental –
construímos uma campanha pela aprovação do Projeto de Lei que institui
cotas raciais. O abaixo-assinado colheu milhares de assinaturas.
Para
a minoria branca que controla a universidade não existe coisa mais
odiosa do que ver uma das universidades mais racistas do Brasil ter seu
espaço ocupado por pessoas que defendam a entrada de pretas e pretos
como estudantes. Sabem que isso altera não só a composição social da
universidade como mexe na estrutura de exploração das força de trabalho
fora dela.
3. Diferente do que imaginaram alguns, o
chamado “Dia D” na USP (nome dado à manifestação do dia 01/10) não era
mais um dia de protesto. Enquanto o seleto grupo de membros do Conselho
Universitário se reunia para aprovar o calendário eleitoral e algumas
medidas cosméticas no processo de escolha para a reitoria, os estudantes
protocolaram sua proposta de anulação daquela eleição e ocuparam a
reitoria. Rodas foi incapaz de ver que o movimento também lhe apresenta
surpresas e mais: esta ocupação ocorria de maneira muito consolidada,
unitária e bem representada pelo Diretório Central dos Estudantes (DCE)
da universidade.
4. A ocupação, com o passar dos dias, não
perdeu o vigor. E muito menos se tornou a pauta de reinvindicação em
si. Ela foi fundamental para servir de apoio à greve que se iniciava.
Muitos dizem que esta é a mais forte greve pelo menos dos últimos dez
anos na universidade. Mais de 30 cursos inteiros aprovaram-na em suas
assembleias, além de estudantes que se incorporaram individualmente.
Portanto, a greve também segue uma crescente, com indicativo de greve de
professores e funcionários.
Vale destacar que a greve na USP Leste
levantou um problemaço à reitoria. Afinal, para resolver o problema da
contaminação comprovada do solo no campus seria preciso reconhecer que
aquela obra é absurdamente irresponsável.
5. As jornadas
de junho colocaram em outro patamar os protestos de ruas no país,
aumentando a sua adesão e aceitação pela população. Tanto as pautas
democráticas – ainda mais se somadas à luta por uma educação melhor –
como os métodos dos movimentos sociais são mais bem aceitos pela
população em geral.
A mídia burguesa, apesar da tentativa incessante,
não conseguiu carimbar os grevistas da USP de “vândalos”, “setores
isolados” ou “rebeldes sem causa”. Isso porque desta vez temos um
movimento propositivo e com propostas concretas. Além de ser chocante
que o estatuto da universidade mantenha-se balizado nos mais retrógrados
ares da ditadura militar. Esse tipo de ideologia não tem sido bem
aceita pelos consumidores de informação. E, claro, os ventos da greve de
professores do RJ, que mantém imenso apoio popular, também batem por
aqui.
6. A reitoria sofreu imensas e históricas derrotas na Justiça. No primeiro pedido de reintegração de posse, o juiz deu um banho de civilidade na Reitoria e negou.
Na audiência de conciliação, a Reitoria negou qualquer negociação, o
que levou o juiz a negar definitivamente a reintegração, argumentando
que a ocupação se trata de um problema político. A Reitoria recorreu. E
ontem (15), exatamente no dia da manifestação, o desembargador também
negou a entrada da polícia, sugerindo um prazo de 60 dias para uma
solução negociada. Este é um dos principais motivos da ira policial na
manifestação. Não lhes permitiram reprimir dentro da universidade,
restou a repressão na rua.
7. Para o governo Alckmin, o
prolongamento do impasse é o pior dos cenários. Imaginar que a USP siga
paralisada por mais dois meses - incluindo o período de realização da
Fuvest e o processo fraudulento de eleição para a próxima reitoria - é
um pesadelo do ponto de vista político. Afinal, ele não só tem
responsabilidade sobre a Polícia Militar como é o interventor oficial do
pleito. Se não é possível derrotar o movimento pela cooptação ou pelo
esvaziamento, sobram apenas as táticas de divisão e repressão aos
grevistas.
8. O governador tucano tem recebido uma
campanha de solidariedade da mídia burguesa. Agora, o conhecido algoz
dos movimentos sociais tenta se tornar vítima do crime organizado.
Informações antigas publicadas recentemente na imprensa colocam Alckmin
como um ameaçado do PCC. Mais do que isso, aposta-se na tese de que o
crime organizado esteja se infiltrando nas manifestações políticas.
Afinal, em sua lógica, é preciso encontrar alguma forma de
criminalização dos movimentos sociais. Não existe ingrediente mais
perfeito do que dizer que o crime organizado atua nos protestos.
Enquanto
isso, as notícias de que uma cadeia de policiais militares pertencem ao
crime organizado ficam em notas de rodapé. É sob uma grande pressão da
sociedade pela desmilitarização da polícia que o tucano precisa disputar
a sociedade, tentando dar alguma razão para a existência de uma tropa
militarizada. E, na USP, os grevistas tentam reverter o convênio que
permite a atuação da PM nos campi – aprovada em um momento desfavorável
com o discurso do medo sob a classe média. Ontem mesmo, um tenente do
16º BPM foi preso por envolvimento com o PCC. Este é o batalhão
designado para fazer as rondas na USP.
9. Existe outra
campanha, no mesmo sentido pró-criminalização das manifestações, que tem
como alvo central os jovens que utilizam a tática Black Bloc. O Estado
tem justificado sua repressão por conta destes ativistas. Com ou sem
Black Bloc, o Estado sempre reprimiu as manifestações e as populações
pobres cotidianamente. Tentam impregnar no senso comum que estes setores
devem ser criminalizados. E, com sua truculência, jogam uma camada de
jovens ativistas cada vez mais para a clandestinidade. No discurso, a
separação é entre o movimento aceitável ou não e na prática a repressão a
todos.
No interior do movimento, muito se debate sobre a
eficácia das táticas Black Bloc para a massificação, ampliação do
movimento e aumento das possibilidades de vitórias. Em nossa opinião,
diante da força do aparato estatal e da mídia burguesa, existem métodos
de ação mais promissores, como a massificação dos atos e greves fortes
construídas de maneira democrática, considerando que o confronto com a
PM não é uma vitória em si e que ações diretas devem ser medidas a
partir da correlação de forças dentro da sociedade e não como um a priori
em manifestações. Mas este é um debate que cabe ao conjunto de
ativistas, que, com o passar do tempo, terão capacidade de construir
espaços de auto-organização para este tipo de debate.
Hoje, o que
se sabe é que estes setores tem intenção de se colocar ao lado de lutas
sociais importantes, como a da USP e dos professores do RJ. E em
confronto com o Estado.
O melhor caminho é seguir debatendo,
construindo articulações, respeito mútuo, para que não se perca de vista
que o inimigo central é o Estado. Para que, mesmo com intenções
parecidas, os diversos setores não facilitem, a partir de suas
diferenças ou ações isoladas, o enfraquecimento do movimento. E que, com
todas as diferenças que possamos ter, não aceitaremos que o Estado siga
reprimindo e criminalizando os movimentos. Dessa forma, colocamos que
nossa defesa é a auto-organização da população para travar suas ações e
táticas para o movimento, através de espaços democraticamente criados,
não concordando com qualquer individuo/organização política que de
maneira isolada vá contra as decisões tiradas coletivamente.
10.
A vitória é possível. Todo o cenário aponta que, diante de um movimento
forte, consistente e unitário, diante de um possível desgaste
prolongado da Reitoria e do Governo, diante de uma repressão incapaz de
derrotar o movimento, diante da ausência de respaldo da Justiça para
esmagar o movimento legalmente, não resta muita opção que o caminho da
negociação.
Resta ao Reitor Rodas recuar, pois está mais do que
evidente que uma nova geração de ativistas que floresce nesta primavera
não recuará dos sonhos de construir uma nova sociedade.
Luísa D'Ávola é diretora do DCE da USP e estudante de Letras
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