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segunda-feira, 30 de setembro de 2013

O mundo é um campo de batalha

O mundo é um campo de batalha


"Dirty Wars – The world is a battlefield" é um dos 25 filmes exibidos até o dia 10 deste mês, no Festival do Rio, com a parceria da Anistia Internacional no Brasil, na Mostra Direitos Humanos. Outros documentários do grupo denunciam a perseguição aos ciganos na Europa, a tragédia dos órfãos do Iraque, a repressão aos movimentos sociais que pipocam pelo mundo, a discriminação aos homossexuais em Uganda. Por Léa Maria Aarão Reis.


Rio de Janeiro - O mundo atual é um campo de batalha, sucessão de guerras “invisíveis”, disfarçadas, encobertas ou dissimuladas patrocinadas pelo governo dos Estados Unidos, e o que há por detrás delas e das ações ilegais da mais secreta divisão de elite do exército americano, a Joint Special Operation Command, o Comando de Operações Especiais Conjuntas que opera em 75 países. Este é o tema geral de um documentário longa-metragem, de 86 minutos, Guerras Sujas, do jornalista independente americano Jeremy Scahill, desdobramento do seu livro de mesmo nome lançado nos Estados Unidos, ano passado. 

Autor de um trabalho anterior, Blackwater – a ascensão do exército mercenário mais poderoso do mundo, traduzido no Brasil pela Companhia das Letras, Scahill é o roteirista e personagem fio condutor da trajetória da dupla através Cabul, no Afeganistão, Aden, no Iêmen, e Mogadíscio, na Somália, no rastro das operações da JSOC. Seu companheiro no trabalho, o fotógrafo e cinegrafista Rick Rowley, dirigiu e montou o doc com estreia mundial no Festival de Sundance deste ano e exibido no verão europeu com grande repercussão.


Dirty Wars – The world is a battlefield é um dos 25 filmes exibidos até o dia 10 deste mês, no Festival do Rio, com a parceria da Anistia Internacional no Brasil, na Mostra Direitos Humanos. Outros documentários do grupo denunciam a perseguição aos ciganos na Europa, a tragédia dos órfãos do Iraque, a repressão aos movimentos sociais que pipocam pelo mundo, a discriminação aos homossexuais em Uganda.

“As ações da JSOC ultrapassam todos os marcos da legalidade internacional,” sublinhou Scahill em conversa com a plateia do filme, depois da sua exibição, na companhia do jornalista do The Guardian, Glen Greenwald. “O mais grave é o governo americano não dizer que está matando também cidadãos americanos, nas operações com drones. É surpreendente, um presidente advogado constitucionalista e Nobel da Paz se apresentar com uma posição explícita, imperialista, diante da instituição da ONU e autorizar diretamente o assassinato de alvos humanos vivos inscritos em listas cada vez mais extensas.” 

Depois das viagens, investigações e entrevistas mostradas em Dirty Wars, Scahill calcula que o total de alvos mortos até agora, apenas no Afeganistão e no Paquistão seja de 17 mil pessoas.E as listas não param de crescer.


No filme, os entrevistados de Scahill são parentes de vítimas – crianças, idosos, pais, avôs, uma mãe de filho assassinado-; ex-integrantes do JSOC (há algumas defecções de oficiais e eles falam em anonimato); alguns “senhores da guerra”, no norte da África como o “General”, antes inimigo local dos americanos, hoje cooptado para fazer o trabalho sujo.

Um velho, na Somália, declara a Scarhill, impressionado: “Os americanos são mestres da guerra. Ótimos professores!”

Em depoimentos constrangidos e telegráficos, apenas dois congressistas de Washington depõem – ou não depõem - sobre as guerras secretas. Invocam, é claro, “questão de segurança nacional”. 

As passagens cinematográficas são produzidas com o próprio jornalista em campo (em Mogadíscio, usando forte proteção contra balas e bombas) e com filmetes e imagens comoventes de pequenas festas familiares abruptamente interrompidas nos massacres repugnantes no meio da noite (uma celebração de batizado no Afeganistão, por exemplo). Ou fotos com cenas de adolescente, no Iêmen, trucidado por drone - sobraram do garoto apenas alguns fios de cabelos presos a um pedaço de crânio -, no quarto da sua casa decorado com símbolos e figuras pop de ícones americanos. Dez dias antes o pai tinha sido derrubado por outro drone.

“Nós, jornalistas independentes, vivemos num estado de vigilância permanente,” diz Scahill. “A máquina de guerra continua de pé e não apenas nos países onde há petróleo. Na América Central, na participação militar na Colômbia, nas guerras na África, na Síria.” 

Onde houver interesses econômicos dos Estados Unidos Co. ou interesses geopolíticos, estratégicos, as guerras secretas são detonadas.

O documentário Guerras Sujas até agora não foi comprado para exibição no Brasil. Talvez seja uma daquelas produções, diz um crítico de filmes, que ou assistimos em festival ou não a veremos nunca mais. Não tem atores atraentes nem estrelas nem photoshop para anabolizar improváveis sequências de ação.

No entanto, além de emocionante, é imprescindível.


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