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sábado, 31 de agosto de 2013

Evidência de ataque químico é forte, mas lembrem: há uma guerra de propaganda no ar

Evidência de ataque químico é forte, mas lembrem: há uma guerra de propaganda no ar


A obviedade de que o uso de armas químicas pelo governo sírio iria contra seus próprios interesses não prova por si só que não fizeram tal uso. Governos e exércitos fazem coisas estúpidas. O problema é que as evidências até agora do uso de armas químicas pelo exército sírio são de segunda mão e vêm de fontes tendenciosas. Por Patrick Cockburn, do 'The Independent'


As imagens mostrando que o exército sírio usou armas químicas em Ghouta - região a leste de Damasco dominada por rebeldes - são impactantes e comoventes. Mas elas podem ser enxergadas ceticamente, pois os relatos feitos a partir delas lembram muito aqueles que foram elaborados sobre Saddam Hussein possuir de armas de destruição em massa antes da invasão britânica e norte-americana do Iraque em 2003. No entanto, os presentes relatos diferem dos anteriores em número de mortos - que variam entre 213 e 1.360 - e na quantidade de evidências no Youtube de corpos e pessoas morrendo, sustentadas por entrevistas de ativistas locais.

Como a oposição iraquiana a Saddam, que proveu a maior parte das evidências de armas químicas, a oposição síria possui todos os incentivos para mostrar o governo de Assad despejando armas químicas com o intuito de provocar uma intervenção internacional. Apesar dos EUA não terem se envolvido militarmente na Síria, o presidente Obama declarou há um ano que o uso de armas químicas por Assad seria ''a gota d'água''. A implicação de tal uso faria com que os EUA respondessem militarmente, apesar da maneira pela qual eles o fariam nunca foi explicitada.

Entretanto, a obviedade de que o uso de armas químicas pelo governo sírio iria contra seus próprios interesses não prova por si só que não fizeram tal uso. Governos e exércitos fazem coisas estúpidas. Mas é difícil imaginar qualquer evidência convincente das razões pelas quais eles teriam-no feito, desde que possuem muitos outros meios de matar pessoas em Ghouta, tais como artilharia pesada ou pequenas armas, cotidianamente usadas. Todos os dias, Damasco ecoa o som da artilharia disparada contra fortalezas rebeldes.

O problema é que as evidências até agora do uso de armas químicas pelo exército sírio são de segunda mão e vêm de fontes tendenciosas. Esta é uma boa razão para que haja 20 times poderosos de expertos da ONU em Damasco para investigar se governo ou oposição têm usado gás venenoso. Eles poderiam ir a Ghouta e investigar os relatos da oposição imediatamente? Nos parece que não, visto que a natureza limitada de seus poderes e a necessidade de atravessar entre territórios do governo e outros dominados por rebeldes.

Em junho, os EUA disseram que possuíam evidências conclusivas do uso de armas químicas pelo governo sírio e por tal motivo ajudariam os rebeldes. A ação norte-americana foi provavelmente desencadeada pela derrota do governo sírio na cidade de al-Qusayr e o medo de que Damasco estivesse começando a dominar o campo de batalha. Especialistas em armas químicas esperavam que os EUA tentariam duramente provar que suas conclusões estavam corretas sendo abertos sobre a origem dos materiais testados e dos meios pelos quais eles conseguiram levá-los a laboratórios dos EUA. Os especialistas também queriam detalhes dos testes laboratoriais, mas muito pouco foi produzido nessa direção.

As organizações midiáticas internacionais têm feito seu melhor para verificar as filmagens do Youtube, mas eles não possuem repórteres os quais tenham testemunhado ataques com armas químicas. O ceticismo sobre vídeos produzidos por ativistas da oposição aumentou nos últimos dois anos, mas frequentemente estas são as únicas evidências disponíveis. A dificuldade é: poderia tudo isto ter sido tramado e editado para provar um ponto? A guerra de propaganda travada pelo Youtube é um importante fronte na guerra civil da Síria. O quanto alguém pode estar certo de que um vídeo de um soldado sendo decapitado por um rebelde ligado à Al-Qaeda não tenha sido encenado pelo governo sírio? Grupos opostos usam vídeos uns contra os outros. Vídeos que pretendem mostrar um massacre de 400 curdos pelos rebeldes parecem que foram fabricados por um partido curdo, usando vídeos de atrocidades similares ocorridas na Síria e no Iraque.

Denúncias indignadas e demandas por investigação por parte dos EUA e da Inglaterra não nos parecem muito convincentes devido às memórias de depoimentos similares sobre as armas de destruição em massa iraquianas. A este estágio da guerra na Síria também não nos parece que tudo será resolvido por uma intervenção estrangeira.

Tradução de Roberto Brilhante


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