Papa chega ao Brasil com dupla missão
Atualizado em 22 de julho, 2013
Cerca de 2,5 milhões de fieis são esperados para a
Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro
Em sua primeira visita ao Brasil, para a Jornada
Mundial da Juventude, o papa Francisco tem pela frente uma dupla missão:
tentar conter o crescimento das denominações evangélicas pentecostais e
arrebanhar fiéis afastados da Igreja Católica que, em número cada vez
maior, se declaram "sem religião".
A tarefa é especialmente desafiadora no Rio de
Janeiro, local escolhido para sediar o evento, que começa na
terça-feira, 23, e vai até o próximo domingo, 28 de julho. A cidade, que
apresenta uma das menores proporções de católicos entre as capitais
brasileiras, reflete, em maior grau, segundo demógrafos, a crise por que
passa o catolicismo no país.
Maior nação católica do mundo desde meados de 1950, quando tomou o
posto da Itália, o Brasil, hoje com 123 milhões de fiéis, atravessa um
acentuado processo de diversificação religiosa.
Nas últimas décadas, o catolicismo, até hoje a
fé dominante no país, vem perdendo terreno para as correntes
evangélicas, ao passo que cresce também o número de pessoas que se
definem como "sem religião".
Dados do último Censo, em 2010, revelaram, pela
primeira vez, que o número de católicos caiu em números absolutos e
relativos no Brasil.
Naquele ano, eles somavam 123,3 milhões, ou 64,6% da população, contra aproximadamente 125 milhões, ou 73,6% do total, em 2000.
Por outro lado, os evangélicos ganharam, no
mesmo período, quase 20 milhões de adeptos, passando de um contingente
de 26,5 milhões (15,4% da população) para 42,3 milhões (22,2% do total).
Já os que se declararam 'sem religião' cresceram de 12,5 milhões (7,4%), em 2000, para 15,3 milhões (8%), em 2010.
Para efeitos de comparação, em 1872, quando o
catolicismo ainda era a religião oficial do país, 99,7% dos brasileiros
se declaravam católicos.
Segundo demógrafos, o fenômeno evidencia uma
mudança da hegemonia religiosa no Brasil, que deve culminar, se mantidas
as atuais tendências, com o fim do catolicismo como religião
majoritária da população até 2040.
Por volta desse ano, haveria um empate técnico
entre o número de católicos e evangélicos no país, de acordo com um
estudo intitulado A dinâmica das filiações religiosas no Brasil entre 2000 e 2010: diversificação e processo de mudança de hegemonia e realizado pelos demógrafos do IBGE José Eustáquio Diniz, Luiz Felipe Walter Barros e Suzana Cavenaghi.
"Entre os 10 maiores países do globo, isso deve
acontecer somente no Brasil", afirmou à BBC Brasil o demógrafo José
Eustáquio Diniz, professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas
do IBGE.
"Entre 2000 e 2010, o equivalente a todo o
acréscimo demográfico, em torno de 21 milhões de pessoas, foi para
outros grupos religiosos", acrescentou.
Raio-X da religião no Brasil
Religião | 1970 | 1980 | 1991 | 2000 | 2010 |
Católicos | 91,8% | 89% | 83% | 73,6% | 64,6% |
Evangélicos | 5,2% | 6,6% | 9% | 15,4% | 22,2% |
Sem religião |
0,8% | 1,6% | 4,7% | 7,4% | 8% |
Outras |
2,2% | 2,8% | 3,3% | 3,6% | 5,2% |
Fonte: IBGE
Rio de Janeiro
Em meio à perda de popularidade do catolicismo, a escolha da sede da
Jornada Mundial da Juventude de 2013 não é mera coincidência.
Cartão-postal do Brasil, o Rio de Janeiro é o melhor retrato da transformação religiosa que o país atravessa.
Para demógrafos, o Estado consiste em uma
espécie de "termômetro" das transições sociodemográficas, antecipando
como será o Brasil do futuro.
"Trata-se do Estado mais urbanizado, mais
metropolizado, mais envelhecido e com as menores taxas de fecundidade do
país. Também é o Estado que tem apresentado a menor percentagem de
filiações católicas, a mais elevada dos sem-religião e a maior
diversidade religiosa", afirma Diniz.
Segundo o levantamento coordenado por Diniz, a
cidade do Rio de Janeiro estaria "adiantada" em relação à média
brasileira em cerca de 20 anos, o Estado do Rio de Janeiro, em 25 anos, e
o colar da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (que reúne os
municípios da região metropolitana com exceção da capital), em torno de
30 anos.
Esta última região, destaca o demógrafo, já
mostra uma situação de empate técnico entre católicos e evangélicos.
Ali, os evangélicos também já são maioria entre crianças, jovens e
mulheres no período reprodutivo (até 39 anos).
Motivos
Na avaliação dos demógrafos, a mudança do perfil
religioso é explicada em grande parte pelas transformações
socioeconômicas da população brasileira nas últimas décadas.
Comparados aos católicos, os evangélicos crescem
a um ritmo mais rápido entre as mulheres, os jovens, a população urbana
e entre as pessoas que se declaram negras e pardas, segmento que mais
cresce no país, explica Diniz.
"O Brasil está ficando mais urbano, mais
feminino, mais miscigenado, com maiores níveis educacionais e mais de
classe média, em relação ao rendimento. Em todos os pontos, os
evangélicos levam vantagem sobre os católicos".
"O único segmento da população em que os católicos tem maioria
absoluta é entre os idosos. Mas, ao morrerem, não serão substituídos por
novos fiéis, ampliando a sangria da Igreja Católica", acrescenta.
Uma pesquisa desenvolvida pelo instituto Data
Popular à que a BBC Brasil teve acesso retrata tal desafio. O
levantamento ouviu 1.501 pessoas em 100 cidades brasileiras em maio
deste ano.
Segundo o estudo, 44,2% dos jovens entrevistados
(entre 16 e 24 anos) se declararam católicos, enquanto que a taxa
chegou a 57,9% entre aqueles que tinham mais de 50 anos.
Além dos aspectos socioeconômicos, acrescenta
Diniz, os evangélicos também cobrem um espectro mais amplo do mercado
religioso, uma vez que são capazes de "customizar a mensagem de fé",
fortalecendo o processo de migração religiosa.
"Há muitas vertentes de igrejas evangélicas pentecostais, adaptadas para todo tipo de público", afirma o demógrafo.
Mas para o teólogo Paulo Fernando Carneiro de
Andrade, professor da PUC-Rio, a missão do papa Francisco, apesar de
difícil, não é impossível.
"Dado o atual contexto, a visita do Papa
Francisco pode incentivar o retorno dos desgarrados a Igreja. Uma de
suas qualidades é, sem dúvida, a empatia", afirmou ele à BBC Brasil
Paulo.
"Nas Américas, diferentemente do que acontece na
Europa, o processo de secularização não caminha para o ateísmo. Aqui as
pessoas se declaram 'sem religião', mas não necessariamente não
acreditam em Deus. É com essas pessoas que o Papa pode voltar a falar",
acrescentou.
Jornada Mundial da Juventude
A Jornada Mundial da Juventude (JMJ) é considerada o maior evento católico do mundo direcionado aos jovens.
Durante o encontro, que durará seis dias, os fiéis vão ter a oportunidade de encontrar o papa e participar de inúmeros atos religiosos.
Em sua última edição, em 2009, a JMJ reuniu cerca de 2 milhões de fiéis em Madri, na Espanha.
O evento foi realizado pela primeira vez em Roma, em 1986, quando 300 mil jovens se reuniram na Praça de São Pedro.
Para o Rio de Janeiro, a organização da JMJ espera receber 2,5 milhões de católicos do mundo todo.
Durante o encontro, que durará seis dias, os fiéis vão ter a oportunidade de encontrar o papa e participar de inúmeros atos religiosos.
Em sua última edição, em 2009, a JMJ reuniu cerca de 2 milhões de fiéis em Madri, na Espanha.
O evento foi realizado pela primeira vez em Roma, em 1986, quando 300 mil jovens se reuniram na Praça de São Pedro.
Para o Rio de Janeiro, a organização da JMJ espera receber 2,5 milhões de católicos do mundo todo.
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